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Durante um século, foi normal acreditar que a Umbanda era uma religião derivada dos cultos africanos de nação, simplificados e sincretizados, para adaptarem-se à realidade brasileira. Mesmo dentro dos terreiros essa era a crença vigente. Isso, porém, não é verdade e é chegado o momento de esclarecer esse equívoco e devolver à Umbanda sua verdadeira face, seus verdadeiros princípios, sua verdadeira origem.
2 – Aumpram, a lei divina.
Ao contrário do que a maior parte das pessoas acredita, a palavra “Umbanda” não é um vocábulo de origem africana. Embora o primeiro registro no Brasil (mbanda) tenha se dado através do idioma kimbundo, falado pelos escravos oriundos de Angola, da região de Luanda, esclarecem os mestres da Fraternidade do Grande Coração (FGC, 2005) que ela é, na verdade uma corruptela da palavra originária do idioma sânscrito, “Aumpram”, que significa “Lei Divina”.
O sânscrito é uma língua antiqüíssima originada na Índia e que é, inclusive, considerada pelos lingüistas como a língua mãe da maioria das línguas faladas no mundo ocidental. Mas, como, então, algo tão antigo pode estar relacionado a uma religião que acaba de completar um século de existência?
Esse é um assunto controvertido e que pode gerar muita polêmica, pois existem várias correntes defendendo origens diferentes. Há os que defendem a origem africana da Umbanda, tratando-a como uma forma abrasileirada dos cultos de nação; há os que defendem ser a Umbanda uma simples mistura de aspectos de diversas religiões, formando um conjunto mais abrangente; há ainda os que acreditam estarem as origens da Umbanda ligadas aos primórdios do planeta. Entendemos ser essa última visão a mais acertada, contudo precisamos ser cautelosos, pois existe muita versão fantasiosa, falando de práticas típicas de Umbanda cultivadas na Terra há centenas de milhares de anos, por espíritos oriundos de outros orbes e de outras galáxias, encarnando e criando civilizações extremamente evoluídas e travando confrontos na extinta Atlântida entre magia positiva e magia negativa.
Voltamos a insistir que não é objetivo deste curso criticar as convicções de ninguém, porém estaremos sempre colocando a razão a serviço da fé. Nesse sentido, vale dizer que a ciência já estabeleceu a origem dos primeiros homens, ainda muito rudimentares, em torno de cem mil anos no passado [1]. Obviamente, antes desse marco não poderia haver práticas religiosas no planeta, pois faltariam praticantes.
Igualmente, não poderíamos sustentar a tese de que civilizações futurísticas, grandemente evoluídas tenham aqui florescido nos primórdios do planeta, pois que isso seria contrário à lógica da evolução, afinal a Terra era naquele momento, na ordem dos mundos, um planeta primitivo, incompatível com um grau elevado de desenvolvimento civilizacional.
Certamente reconhecemos o advento de espíritos oriundos de outros orbes, aqui chegados na condição de degredados, com a missão de contribuir para a evolução dos terráqueos primitivos, mas também temos claro que sua chegada se deu dezenas de milhares de anos depois do surgimento dos primeiros hominídeos. Essa visão é expressamente sustentada por Kardec em A Gênese:
“De acordo com o ensino dos Espíritos, foi uma dessas grandes imigrações, ou, se quiserem, uma dessas colônias de Espíritos, vinde de outra esfera, que deu origem à raça simbolizada na pessoa de Adão e, por essa razão mesma, chamada raça adâmica. Quando ela aqui chegou, a terra já estava povoada desde tempos imemoriais. Como a América, quando aí chegaram os europeus.
Mais adiantada do que as que a tinham precedido neste planeta, a raça adâmica é, com efeito, a mais inteligente, a que impele ao progresso todas as outras. A Gênese no-la mostra, desde os seus primórdios industriosa, apta às artes e às ciências, sem haver passado aqui pela infância espiritual, o que não se dá com as raças primitivas, mas concorda com a opinião de que ela se compunha de Espíritos que já tinham progredido bastante. Tudo prova que a raça adâmica não é antiga na terra e nada se opõe a que seja considerada como habitando este globo desde apenas alguns milhares de anos, o que não estaria em contradição nem com os fatos geológicos, nem com as observações antropológicas, antes tenderia a confirmá-las.” (KARDEC, 1996, p.226/227) (grifo nosso).
Também reconhecemos que esses espíritos degredados traziam consigo um intelecto muito desenvolvido, com um grande número de conhecimentos que estavam gravados em sua memória espiritual, sendo trazidos latentes para as encarnações que passaram a acontecer na Terra e tendo gradativamente desabrochado, passando a servir como uma poderosa mola propulsora do desenvolvimento das raças primitivas de terráqueos [2].
Sabemos ainda que esses espíritos, provenientes principalmente de Capela começaram suas encarnações em terras das extintas Lemúria e Atlântida, em meio a tribos ainda selvagens, com as quais compartilharam seus conhecimentos científicos. Sobre isso convém assinalar o testemunho incontestável de Emanuel em A Caminho da Luz:
“Entre as raças negra e amarela, bem como entre os grandes agrupamentos primitivos da Lemúria, da Atlântida e de outras regiões que ficaram imprecisas no acervo de conhecimentos dos povos, os exilados da Capela trabalharam proficuamente, adquirindo a provisão de amor para suas consciências ressequidas. Como vemos, não houve retrocesso, mas providência justa de administração, segundo os méritos de cada qual, no terreno do trabalho e do sofrimento para a redenção.”(XAVIER, 2007, p. 40)
Os conhecimentos trazidos por esses espíritos degredados - entre os quais se inseria o das vibrações divinas harmonizadoras do universo, conhecidas hoje como Orizás - eram ainda impossíveis de serem compreendidos pelos homens primitivos que habitavam a terra, o que fez com que os terráqueos começassem a considerá-los como divindades. Esse fato é relatado por Edgar Armond em Os Exilados da Capela:
“Logo, após, os primeiros contatos que se deram com os seres primitivos e , reencarnados os capelinos nos tipos selecionados já referidos, verificou-se de pronto tamanha dessemelhança e contraste, material e intelectual, entre essas duas espécies de homens, que sentiram aqueles imediatamente a evidente e assombrosa superioridade dos ádvenas, que passaram logo a ser considerados super-homens, semideuses, Filhos de Deus, como diz a gênese mosaica, e, como é natural, a dominar e dirigir os terrícolas .” (ARMOND,1999, p. 56/57)
Como todo ser primitivo tende a tratar como sobrenatural aquilo que não compreende racionalmente, e como muitos capelinos dominavam conhecimentos científicos relacionados à manipulação de energia e fluidos sutis, esses seres passaram a ser tratados como magos e seu conhecimento tratado como magia.
Sucede que entre os degredados, houve os que, desde o princípio, buscaram o aprimoramento pela dedicação ao bem, e aqueles que, empedernidos, persistiram em dar vazão aos maus instintos, continuando a praticar o mal. Como muitos lançavam mão da manipulação de fluidos, tanto para bem quanto para mal, fica fácil perceber como se deu o surgimento de designações como “magia branca” e “magia negra”.
Posteriormente, com o cataclismo que culminou no afundamento da Atlântida, muitos sobreviventes migraram para terras asiáticas, americanas e africanas, onde se fixaram. Na Ásia, acabaram por fincar raízes na Índia, onde deram origem aos Árias, precursores do tronco étnico indo-europeu. Na África, fixaram-se principalmente no Egito e na Etiópia. Ali deram origem às grandes civilizações egípcia e etíope.
3 – O sincretismo: a união de três povos.
Em solo africano, o conhecimento da Aumpram, distorcido e preservado através da tradição oral, acabou por originar as religiões tribais, nas quais se cultuavam Orixás, como seres divinos, personificados, possivelmente, por capelinos que, durante suas encarnações realizaram façanhas consideradas pelos primitivos como grandes feitos de magia.
Boa parte dos conhecimentos científicos relacionados à manipulação de fluidos e energias foi assimilada por esses povos que continuaram a praticá-los, embora de forma rudimentar. Toda tribo possuía seu feiticeiro, seu curandeiro que nada mais era que um indivíduo que aprendera com algum antepassado um pouco do legado científico dos capelinos.
Tais práticas eram parte integrante da religião daqueles povos, religião essa que também incluía o intercâmbio entre encarnados e desencarnados, através das faculdades mediúnicas, embora também a mediunidade fosse tratada como um elemento mágico.
Passando de geração em geração, sob a forma de religião ancestral, essas práticas aportaram no Brasil, a partir do Século XVI, juntamente com os escravos africanos que começavam a chegar.
Nesse ponto, é imprescindível assinalar que a religião que chegava com os africanos, já há muitos séculos não era a Aumpram originária. Era, na verdade, uma religião com traços bastante primitivos, marcada por superstições e crendices; temperada com elementos introduzidos por espíritos oportunistas e malévolos, como sacrifício de animais e oferendas de baixo padrão vibratório.
Os escravos, proibidos por seus senhores de praticarem sua religião e forçados pelos padres a se converterem ao catolicismo, passaram a manter em seus altares, montados nas senzalas, imagens de santos católicos, fingindo cultuá-los, mas preservando secretamente a adoração a suas divindades tribais. Essa situação perdurou durante todo o período da escravidão.
Paralelamente a isso, havia os indígenas brasileiros, também descendentes de sobreviventes da extinta Atlântica, cuja religião também continha elementos “mágicos” remanescentes dos conhecimentos da Aumpram.
Do convívio entre índios e negros aconteceu uma natural integração desses conhecimentos que acabou por produzir modificações tanto na religião dos escravos, quanto na dos índios.
Por fim, vale salientar que o próprio catolicismo praticado naquela época pelo elemento branco era uma religião marcada por superstições e por misticismo: crença no demônio, em práticas de bruxaria, em acontecimentos miraculosos e sobrenaturais, enfim, em elementos “mágicos”, decorrentes de práticas originadas principalmente na Idade Média, a idade das trevas..
Além disso, era extremamente comum, nos momentos de dificuldades, como doenças em família, os senhores brancos procurarem em segredo os curandeiros negros nas senzalas, para pedir ajuda aos Orixás.
Tudo isso acabou por produzir uma mistura de culturas religiosas que gerou um clima de tolerância tácita, viabilizando o culto dos Orixás em terras brasileiras, desde que tal culto acontecesse sob o disfarce das imagens dos santos católicos. A isso se deu o nome de sincretismo, palavra originária do grego e formada pelos radicais “sim” (união, convergência) e “Creta” (ilha grega do Mar Egeu). Conta a História que Creta era habitada por povos rivais, mas, quando foi invadida por um povo estrangeiro, seus habitantes se uniram para defender a ilha do inimigo comum.
4 – A corrente astral de umbanda.
Enquanto esses fatos se sucediam, milhões de espíritos oriundos de Capela continuavam seus ciclos encarnatórios em diversos pontos do planeta. Muitas dessas encarnações já eram missionárias, pois grande número desses espíritos já se encontravam redimidos e em condições de retornar ao orbe de origem, mas, ligados por fortes vínculos afetivos ao orbe terrestre, optavam por aqui permanecer e auxiliar na evolução da Terra.
Esses espíritos – entre os quais se encontram nomes venerandos, tanto no Brasil, como em várias partes do globo – profundos conhecedores da ciência cósmica, formavam, com a permissão e a bênção de Jesus, uma fraternidade no Astral Superior, conhecida como AUMBANDHÃ [3] (Luz Divina). Por serem grandes conhecedores da ciência cósmica, a principal missão dessa fraternidade é trabalhar para combater o uso maléfico dessa ciência, conhecido popularmente como magia negra.
Muitos dos espíritos pertencentes a essa fraternidade tiveram, ao longo da colonização, encarnações em terras brasileiras, onde ocuparam corpos de escravos ou índios (provavelmente, muitos tenham completado sua redenção nessas encarnações), tendo contribuído para disseminar os conhecimentos de manipulação energética entre essas duas raças.
5 – O astral inferior e a baixa ciência.
A evolução não acontece igualmente para todos e, milhares de espíritos detentores de conhecimentos científicos mantiveram-se afastados da Lei Divina, numa atitude de revolta e insubordinação, formando no astral uma corrente de baixíssima vibração, dispostos sempre a usar seus conhecimentos para praticar o mal, semeando dor e sofrimento na face do planeta, sempre que encontrassem condições propícias para estabelecerem seu império entre os encarnados, criando óbices para o desenvolvimento do planeta como um todo.
As práticas cultivadas e ensinadas por esses espíritos acabaram ganhando a denominação genérica de magia negra, que nada mais é que a aplicação de conhecimentos científicos com o objetivo de fazer o mal.
6 – Das macumbas à umbanda.
Em 1888 o Brasil era um país marcado por profundas desigualdades sociais, com uma distribuição de renda perversa, onde só existiam ricos e pobres.
Com a Lei Áurea, milhares de escravos libertos deixaram de contar com o precário sustento que tinham nas casas de seus antigos senhores e ficaram entregues à própria sorte, sem ter como nem do que sobreviver. Surgia uma nova classe, a dos miseráveis.
Muitos desses ex-escravos, por força de sua religião ancestral, estavam habituados ao intercâmbio com mundo espiritual e dominavam alguns conhecimentos manipulatórios. Encontraram nisso uma forma de sobrevivência, fazendo curas, benzições, e trabalhos espirituais diversos em troca de dinheiro.
Rapidamente as tendas abertas com essa finalidade caíram na simpatia da grande massa excluída da população e passaram a ser freqüentadas em busca de todo tipo de ajuda, inclusive em busca de trabalhos dirigidos para as vinganças pessoais, para as conquistas amorosas entre outras práticas atentatórias ao exercício do livre arbítrio e consequentemente à Lei Divina.
Essas tendas, muito populares, principalmente no Rio de Janeiro, recebiam a designação de “macumbas” e rapidamente se transformavam em grandes pólos de difusão da magia negra.
A providência divina, sempre atenta às necessidades dos homens, não tardaria a intervir para impedir um avanço desproporcional do mal.
No ano de 1908 foi criado o movimento que se destinava a empreender veemente combate às práticas espúrias de “magia”, bem como a levar o bálsamo divino a todos aqueles que necessitassem de ajuda, principalmente os pobres e excluídos que nada tinham.
Era a Umbanda que lançava seus marcos na terra do Cruzeiro e se anunciava como a religião do futuro. Norberto Peixoto (2006) assim narra os fatos que culminaram com a criação da nova religião entre nós:
"Em fins de 1908, uma família tradicional de Neves, Niterói –RJ, foi surpreendida por uma ocorrência que tomou aspectos sobrenaturais: o jovem Zélio Fernandino de Moraes, que fora acometido de estranha paralisia, que os médicos não conseguiam debelar, certo dia ergueu-se do leito e declarou: "amanhã estarei curado". No dia seguinte, levantou-se normalmente e começou a andar, como se nada lhe houvesse tolhido os movimentos. Contava 17 anos de idade e preparava-se para ingressar na carreira militar na Marinha. A medicina não soube explicar o que acontecera. Os tios, sacerdotes católicos, colhidos de surpresa, nada esclareceram. Um amigo da família sugeriu então uma visita à Federação Espírita de Niterói, presidida na época por José de Souza. No dia 15 de novembro, o jovem Zélio foi convidado a participar da sessão, tomando um lugar à mesa. Tomado por uma força estranha e superior a sua vontade, e contrariando as normas que impediam o afastamento de qualquer dos componentes da mesa, o jovem levantou-se, dizendo:"aqui está faltando um flor", e saiu da sala indo ao jardim, voltando logo após com uma flor, que depositou no centro da mesa. Esta atitude insólita causou quase que um tumulto. Restabelecidos os trabalhos, manifestaram-se nos médiuns kardecistas espíritos que se diziam pretos escravos e índios. Foram convidados a se retirarem, advertidos de seu estado de atraso espiritual.
Novamente uma força estranha dominou o jovem Zélio e ele falou, sem saber o que dizia. Ouvia apenas a sua própria voz perguntar o motivo que levava os dirigentes dos trabalhos a não aceitarem a comunicação daqueles espíritos e do porquê em serem considerados atrasados apenas por encarnações passadas que revelavam.
Seguiu-se um diálogo acalorado, e os responsáveis pela sessão procuravam doutrinar e afastar o espírito desconhecido, que desenvolvia uma argumentação segura. Um médium vidente perguntou: "Por quê o irmão fala nestes termos, pretendendo que a direção aceite a manifestação de espíritos que, pelo grau de cultura que tiveram, quando encarnados, são claramente atrasados ? Por quê fala deste modo, se estou vendo que me dirijo neste momento a um jesuíta e a sua veste branca reflete uma aura de luz ? E qual o seu nome irmão ? E o espírito desconhecido falou: "Se julgam atrasados os espíritos de pretos e índios, devo dizer que amanhã (16 de novembro) estarei na casa de meu aparelho, para dar início a um culto em que estes irmãos poderão dar suas mensagens e, assim, cumprir missão que o Plano Espiritual lhes confiou. Será uma religião que falará aos humildes, simbolizando a igualdade que deve existir entre todos os irmãos, encarnados e desencarnados. E se querem saber meu nome, que seja este: Caboclo das Sete Encruzilhadas, porque para mim não haverá caminhos fechados.
O vidente retrucou: "Julga o irmão que alguém irá assistir a seu culto"? perguntou com ironia. E o espírito já identificado disse: "cada colina de Niterói atuará como porta-voz, anunciando o culto que amanhã iniciarei".
No dia seguinte, na casa da família Moraes, na rua Floriano Peixoto, número 30, ao se aproximar a hora marcada, 20:00 h, lá já estavam reunidos os membros da Federação Espírita para comprovarem a veracidade do que fora declarado na véspera; estavam os parentes mais próximos, amigos, vizinhos e, do lado de fora, uma multidão de desconhecidos.
Às 20:00 h, manifestou-se o Caboclo das Sete Encruzilhadas. Declarou que naquele momento se iniciava um novo culto, em que os espíritos de velhos africanos que haviam servido como escravos e que, desencarnados, não encontravam campo de atuação nos remanescentes das seitas negras, já deturpadas e dirigidas em sua totalidade para os trabalhos de feitiçaria; e os índios nativos de nossa terra, poderiam trabalhar em benefício de seus irmãos encarnados, qualquer que fosse a cor, a raça, o credo e a condição social. A prática da caridade, no sentido do amor fraterno, seria a característica principal deste culto, que teria por base o Evangelho de Jesus.
O Caboclo estabeleceu as normas em que se processaria o culto. Sessões, assim seriam chamados os períodos de trabalho espiritual, diárias, das 20:00 às 22:00 h; os participantes estariam uniformizados de branco e o atendimento seria gratuito. Deu, também, o nome do Movimento Religioso que se iniciava: UMBANDA – Manifestação do Espírito para a Caridade.
A Casa de trabalhos espirituais que ora se fundava, recebeu o nome de Nossa Senhora da Piedade, porque assim como Maria acolheu o filho nos braços, também seriam acolhidos como filhos todos os que necessitassem de ajuda ou de conforto.
Ditadas as bases do culto, após responder em latim e alemão às perguntas dos sacerdotes ali presentes, o Caboclo das Sete Encruzilhadas passou a parte prática dos trabalhos, curando enfermos, fazendo andar paralíticos. Antes do término da sessão, manifestou-se um preto-velho, Pai Antônio, que vinha completar as curas. No dia seguinte, verdadeira romaria formou-se na rua Floriano Peixoto. Enfermos, cegos etc. vinham em busca de cura e ali a encontravam, em nome de Jesus. Médiuns, cuja manifestação mediúnica fora considerada loucura, deixaram os sanatórios e deram provas de suas qualidades excepcionais.
A partir daí, o Caboclo das Sete Encruzilhadas começou a trabalhar incessantemente para o esclarecimento, difusão e sedimentação da religião de Umbanda. Além de Pai Antônio, tinha como auxiliar o Caboclo orixá Malé, entidade com grande experiência no desmanche de trabalhos de baixa magia.
Em 1918, o Caboclo das Sete Encruzilhadas recebeu ordens do Astral Superior para fundar sete tendas para a propagação da Umbanda. As agremiações ganharam os seguintes nomes: Tenda Espírita Nossa Senhora da Guia; Tenda Espírita Nossa Senhora da Conceição; Tenda Espírita Santa Bárbara; Tenda Espírita São Pedro; Tenda Espírita Oxalá, Tenda Espírita São Jorge; e Tenda Espírita São Jerônimo.
Embora não seguindo a carreira militar para a qual se preparava, pois sua missão mediúnica não o permitiu, Zélio Fernandino de Moraes nunca fez da religião sua profissão. Trabalhava para o sustento de sua família e diversas vezes contribuiu financeiramente para manter os templos que o Caboclo das Sete Encruzilhadas fundou. Ministros, industriais, e militares que recorriam ao poder mediúnico de Zélio para a cura de parentes enfermos e os vendo recuperados, procuravam retribuir o benefício através de presentes, ou preenchendo cheques vultosos. "Não os aceite. Devolva-os", ordenava sempre o Caboclo.
A respeito do uso do termo espírita e de nomes de santos católicos nas tendas fundadas, o mesmo teve como causa o fato de naquela época não se poder registrar o nome Umbanda, e quanto aos nomes de santos, era uma maneira de estabelecer um ponto de referência para fiéis da religião católica que procuravam os préstimos da Umbanda. O ritual estabelecido pelo Caboclo das Sete Encruzilhadas era bem simples, com cânticos baixos e harmoniosos, vestimenta branca, proibição de sacrifícios de animais. Dispensou os atabaques e as palmas. Capacetes, espadas, cocares, vestimentas de cor, rendas e lamês não seriam aceitos. As guias usadas são apenas as que determinam a entidade que se manifesta. Os banhos de ervas, os amacis, a concentração nos ambientes vibratórios da natureza, a par do ensinamento doutrinário, na base do Evangelho, constituiriam os principais elementos de preparação do médium." (PEIXOTO, Norberto, 2006, p. 16 a 20)
Por tudo que foi dito, pode-se perceber que a Umbanda é uma religião idealizada no astral, que se serviu de nomes e termos também presentes nos rituais de origem africana, com o intuito de melhor se comunicar inicialmente com as camadas menos favorecidas da população, naquele momento já habituadas ao vocabulário predominante nas macumbas.
Logicamente, a presença de santos católicos também é um traço que já existia nos rituais originários de nação, para burlar a intolerância dos brancos e que, num segundo momento passou a servir como um elemento para também deixar mais à vontade os muitos católicos que frequentemente buscavam consolo espiritual nos terreiros de Umbanda.
Percebe-se claramente que Umbanda não é uma simplificação dos ritos de nação. Na verdade é uma religião com princípios e práticas próprios que, inclusive, guardam profundas diferenças em relação aos ritos tribais, começando por sua teologia e por sua base triangular.
NOTAS EXPLICATIVAS
[1] Oficialmente a ciência reconhece a existência do homem de Neandertal num período compreendido entre 150.000 e 35.000 anos no passado. Observe-se que o Neandertal corresponde ao chamado homo sapiens
[2] O homem de Cro-Magnon, reconhecido presentemente como o ancestral já mais próximo do homem atual (homo sapiens sapiens) viveu num período que se estende de 100.000 e 35.000 anos no passado e pertence à quarta raça atlante.
[3] Existem referências à existência dessa corrente astral desde há 700.000 anos, mas esse é um assunto sobre o qual não existe unanimidade doutrinária e, por isso, optamos por não tomar como verdadeiro neste artigo, já que o objetivo é, acima de tudo, produzir conhecimento seguro. De qualquer modo, fazemos a nota, a fim de que o fato não seja simplesmente omitido.
BIBLIOGRAFIA
1- ARMOND, Edgard. Os exilados da capela. 3ª ed. São Paulo. Aliança, 1999.
2- KARDEC, Allan. A gênese. 37ª ed. Rio de Janeiro. FEB, 1996.
3- PEIXOTO, Norberto. A missão da umbanda. 1ª ed. Limeira. Conhecimento, 2006.
4- XAVIER, Francisco Cândido. A caminho da Luz. 35ª ed. Rio de Janeiro. FEB, 2007